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Angola

08 de Novembro, 2016

As cooperativas como instituições financeiras

Por Carla Pataca |  27 de Agosto, 2016, Jornal de Angola Online


Licenciada pelo BNA em 2014 e inaugurada a 26 de Agosto de 2015, a Cooperativa de Crédito dos Funcionários da Presidência (COOCREFP) é a primeira Cooperativa de Crédito no País criada com a visão de servir de instrumento catalisador no reforço da solidariedade e do serviço em prol da melhoria das condições sociais e económicas dos seus Cooperados e respectivas famílias.

Subordinada aos princípios norteadores instituídos pela Aliança Internacional de Cooperativas, a COOCREFP pretende, através da sua actividade, contribuir para uma comunidade socialmente mais equilibrada, e economicamente forte.

Os princípios norteadores são sete, nomeadamente:

1. Adesão voluntária e livre permanência dos seus membros. São organizações abertas aos interessados (que normalmente têm algum aspecto em comum) em beneficiar dos seus serviços e que em simultâneo cumpram com as obrigações como cooperados e respeitem os estatutos da Cooperativa;

2. Gestão e Administração democrática. Independentemente da sua capacidade financeira, cada membro tem direito a um voto por cada decisão relevante quanto aos destinos da Cooperativa. Os órgãos sociais são eleitos e destituídos por maioria de votos em Assembleia Geral. Cada membro exerce o papel de cliente e em simultâneo de accionista, resultando deste facto a importância da participação e acompanhamento de cada cooperado;

3. Participação económica dos seus membros. É através da participação dos seus membros (pagamento de quotas, depósito de poupanças, etc.) que a Cooperativa se fortalece, permitindo que se realizem os empréstimos. No final de cada exercício fiscal e por decisão em Assembleia Geral, por intermédio de voto maioritário, é efectuada uma distribuição, e/ou um investimento total ou parcial das participações, rentabilizando a base financeira da cooperativa, e por conseguinte dos seus membros, que beneficiam directamente com o crescimento económico-financeiro da Cooperativa;

4. Entidades Autónomas e Independentes, podendo de forma democrática votar sobre que decisões de gestão tomar, e com que entidades se associam, visando o fortalecimento da Cooperativa;

5. Educação, Informação e Formação dos seus membros para que contribuam e participem de forma efectiva no fortalecimento da estrutura da Cooperativa. Igual exercício é feito com o público em geral sobre os benefícios do Cooperativismo;

6. Cooperam entre Cooperativas, cientes dos benefícios da “cooperação”. As Cooperativas juntam-se e colaboração entre si, a fim de reforçarem as suas estruturas, promoverem os movimentos do Cooperativismo a nível das entidades regionais, nacionais e internacionais;

7. Preocupação e interesse pela comunidade, promovendo o desenvolvimento sustentável das comunidades. Apesar de ser uma instituição financeira não bancária, presta serviços bancários. A operação de crédito, por exemplo, é disponibilizada através de taxas mais acessíveis em comparação com o mercado bancário tradicional. Neste âmbito, as Cooperativas podem servir de entidades intermediárias na relação entre os bancos e a comunidade. Com uma base alargada de clientes, a Cooperativa como instituição credível e com critérios de organização reconhecidos mune-se de capacidade negocial junto dos bancos. Tendo como fim último da sua actividade o bem social e não obstante ser uma instituição que não visa o lucro, as Cooperativas devem ser rentáveis, sob pena de se tornar inviável a sustentabilidade das suas estruturas.

Cooperativismo em Angola

O Cooperativismo surge oficialmente nos anos 1800 no Reino Unido. Entretanto, não é um conceito estranho para a comunidade angolana, que desenvolve a actividade de cooperativismo mesmo no seio familiar, através da conhecida kixiquila, a preparação do dote para o casamento ou para um óbito. É exercitado neste pequeno círculo um sentido de organização e preocupação pelo bem-estar social e comum.

O Cooperativismo de Crédito, na sua versão oficial, e dada a especificidade do sector em que actua, com o devido respaldo legal e supervisão da entidade reguladora do sistema financeiro angolano – BNA – não é mais do que a união de indivíduos que, de forma organizada e com regras de actuação democraticamente eleitas, desenvolvemuma actividade, visando o bem comum. Os indivíduos organizam-se visando colmatar as preocupações sociais e económicas dos seus associados e da comunidade em que estão inseridos. A COOCREFP foi criada pelos Órgãos Auxiliares da Presidência da República para atender às necessidades dos funcionários e suas famílias.

No Cooperativismo de crédito todos os cooperados são chamados acontribuir com as quotas, a depositar as suas poupanças na Cooperativa e a “supervisionar” o fim dado a cada cêntimo, que compõe os activos da Cooperativa.

Uma vez cooperados, todos têm direito aos mesmos benefícios, serviços e produtos, independentemente da sua participação financeira. No Cooperativismo não existe a distinção no tratamento nem no atendimento. São realçados valores como a igualdade, a solidariedade, a entreajuda e o bem comum.

O processo de crédito, em particular, é submetido a uma análise cuja decisão emanada tem em conta a capacidade de endividamento do solicitante.

Ao contrário dos bancos, nas Cooperativas os Cooperados são os próprios accionistas, ou donos e têm o direito de, a qualquer momento e de forma organizada, solicitar a prestação de contas, junto do órgão de gestão da Cooperativa. Este mesmo órgão é eleito e destituído também pelos Cooperados. Ou seja, o controlo e orientação estratégica da Cooperativa é dos próprios cooperados.

Contribuição para o desenvolvimento sustentável

Nos dias de hoje, o Cooperativismo pode ser considerado um braço forte, como suporte, dos Governos na procura de soluções de sustentabilidade económica e social.
Para as economias dos países que enveredaram pelo Cooperativismo como aposta viável na solução dos problemas sociais e económicos com que se depararam, existem provas da capacidade de injectar capital na ordem dos biliões nessas mesmas economias, ao mesmo tempo que reduzem os problemas sociais. Casos de estudo no Quénia, Canadá, França, Índia, Inglaterra e Brasil podem servir de exemplo para a economia de Angola.

As Cooperativas do mundo inteiro, atendendo à sua capacidade de actuação no seio das comunidades, são chamadas a apoiar as sociedades, os países, o mundo a atingir os 17 Objectivos para o Desenvolvimento Sustentável do Milénio propostos pela ONU, relacionados com a eliminação da pobreza e da fome, uma vida saudável, educação inclusiva e de qualidade, sustentabilidade ambiental e das economias.

À semelhança do que outras economias viveram e continuam a vivenciar, usando o Cooperativismo como força motora, pelas provas visíveis de sustentabilidade económica Angola e os Angolanos podem igualmente superar os desafios que a actual crise nos dá oportunidade de encarar para melhorarmos e nos fortalecermos social, económica e culturalmente.

O Cooperativismo, em especial o Cooperativismo de Crédito, pode ser encarado como uma via de reforço ao Cooperativismo genérico, na medida em que o acesso ao financiamento, que condiciona a expansão dos serviços das Cooperativas a outros sectores, tem sido um constrangimento.

O Cooperativismo contribui para a minimização do desemprego, redução da pobreza, contribui para a inclusão financeira, empoderamento das mulheres como força actuante no sustento das famílias, contribuem para a segurança alimentar, contribui para o reforço do empreendedorismo e para a melhoria das condições sociais e económicas das comunidades em que estão inseridas.

Conhecidos os benefícios do Cooperativismo e tendo em conta a fase particular que atravessa o País, o fomento do Cooperativismo deve ser incentivado por mais instituições públicas e privadas, que invistam através do Cooperativismo no escape aos problemas sociais e económicos que assolam o País.

No Cooperativismo de Crédito, o cooperado é informado é formado e educado para contribuir, para poupar, para participar. É reforçado o exercício do “Juntos Podemos”, “Juntos Realizamos”, no sentido de tornar uma sociedade mais participativa, mais contributiva também.

O indivíduo é chamado a receber o peixe, mas também e, antes de tudo, a pescar…

As Cooperativas de Crédito, não obstante recorrerem também a financiamento externo para suportarem as suas despesas e criarem oportunidades de negócio para os seus Cooperados, são um instrumento impulsionador natural para a poupança. Incentivando os seus membros a depositarem mensalmente as quotas, estes membros são sensibilizados a contribuir com o que têm para que, em jeito de “entreajuda” e de forma segura e fiável (pois é devido todo rigor e transparência na análise e concessão de crédito), estas mesmas contribuições ou poupanças sirvam de crédito para outros membros mais necessitados ou carenciados.

A solidariedade, no conceito de Cooperativismo, é colocada em prática, os indivíduos unem-se e transformam o pouco em muito, tornando possível e acessível uma convivência social mais equilibrada e harmoniosa.

Rentabilização

Fruto das suas estruturas organizativas, obedecendo às boas práticas de gestão internacionalmente aceites sobre Governação Corporativa e uma imagem credível, as Cooperativas de Crédito permitem o acesso aserviços financeiros a preços mais acessíveis, podendo também servir de intermediários na relação financeira entre os seus membros e os bancos ou, de forma autónoma, disponibilizar créditos a taxas mais acessíveis.

Esta intermediação pode também ser conduzida para outro tipo de parcerias. As Cooperativas, respondendo pelo grupo de membros, têm a vantagem de negociar e facilitar o acesso a bens e serviços a preços mais acessíveis, com a mesma qualidade, daquela que teriam acesso os indivíduos se fazendo uma abordagem isolada.

Factores de sucesso

Os factores de sucesso das Cooperativas são:

- A participação dos Cooperados (com depósitos, com operações e acompanhamento da evolução da Cooperativa, por intermédio da participação em Assembleia Geral, altura em que a Administração eleita pelos Cooperados presta contas aos Cooperados e define as linhas gerais e relevantes de actuação da Cooperativa);

- Gestão transparente, rigorosa e eficiente por parte dos Cooperados eleitos para a Gestão da Cooperativa;

- Inovação dos produtos e serviços oferecidos;

- Ambiente Regulatório e Tributário favorável

Actuação e Base legal

As Cooperativas podem ser criadas e desenvolvidas nos mais variados sectores de actividade. Existem em Angola Cooperativas no sector das pescas, agrícola, transportes, habitacional, etc., e muito recentemente surgiram também as Cooperativas de Crédito como instituições financeiras não bancárias.

As Cooperativas de Crédito têm especificamente como regulamentação de suporte a Lei das Cooperativas, de 23/2015, de 31 de Agosto, a Lei nº12 de 2015, de 17 de Junho – Lei de Base das Instituições Financeiras Bancárias e não Bancárias, o Decreto Presidencial nº 22/2011, de 19 de Janeiro, e o Aviso (BNA) nº 8/2011, de 15 de Julho.